Com altas temperaturas e baixa umidade relativa do ar, o clima foi o assunto mais comentando no decorrer da semana, especialmente ontem. É quase um consenso entre os belo-horizontinos: “Está insuportável”. Até mesmo para os amantes do calor tem sido difícil ficar longe de um ventilador ou do ar-condicionado. E a fervura não deve dar trégua aos moradores da capital mineira. Recordes podem ser batidos hoje. Entretanto, amanhã, uma frente fria deve trazer um pequeno e nada duradouro alívio.
Diante de tal cenário, os cuidados com a saúde são fundamentais para evitar prejuízos que podem ser trazidos pelas altas temperaturas. Muita hidratação é a regra número um. E o protetor solar também não deve ser esquecido por quem pretende se expor ao sol. Outra complicação pode vir das queimadas que assolam o estado, com riscos respiratórios provocados pela fumaça (leia texto nesta página).
Hoje, a intensificação do calor virá acompanhada de uma piora na qualidade do ar. Os índices de umidade relativa podem chegar a 10%, o que coloca a cidade em estado de alerta, de acordo com a classificação de risco da Organização Mundial da Saúde (OMS). “Vai continuar seco, quente e com céu claro”, explica Claudemir de Azevedo, meteorologista do 5º Distrito do Instituto de Meteorologia de Minas Gerais (Inmet).
Ontem, a auxiliar administrativa Josi Rodrigues, de 33 anos, passou quatro horas na estrada entre Coronel Fabriciano, no Vale do Aço, e Belo Horizonte e pôde constatar a situação de “alto-forno”. A primeira parada na capital mineira foi para tomar um sorvete com o sobrinho Rafael, na Região Centro-Sul, onde o Inmet chegou a computar 34,7°C no Bairro Santo Agostinho. “Passei quatro horas dentro de um carro. Estava um calorão insuportável. Precisava me refrescar, o sorvetinho caiu muito bem”, contou. Ela sonha com temperaturas mais amenas neste fim de semana: “Assim não dá.”
Na quarta-feira, os termômetros alcançaram 37,3°C, entre as 13h e as 14h, na estação meteorológica da Pampulha. Essa temperatura é a maior no mês de setembro desde o início da série histórica feita pelo Inmet, iniciada em 1910. É também a terceira maior marca já registrada em Belo Horizonte pelo Inmet no período. Ontem, na mesma regional, o Inmet computou a maior temperatura do dia na capital mineira: 36,1°C.
Curtir uma boa sombra e passear com os animais de estimação são opção para quem está longe de praias, piscinas ou cachoeiras. Na tarde de ontem, Silva Castro, de 37, levou a cachorrinha Luna para uma volta na Praça da Liberdade, também Região Centro-Sul da capital mineira. “Não tem como ficar em casa. O calor está muito difícil. Fica mais complicado até para usar máscara na rua. A parte boa é que a praça está mais tranquila. Nos outros dias, estava mais aglomerada”, disse.
A chegada de uma frente fria amanhã pode trazer um pequeno alívio, mas os índices seguem críticos. “A máxima no domingo será de 34°C e a umidade do ar deve ficar entre 20% e 30%”, comenta Claudemir de Azevedo. “Melhora em relação ao que está, mas segue quente e seco”. E nos dias seguintes as temperaturas devem voltar a subir. Não há chances de chuva para a Grande BH nos próximos dias.
EM MINAS
A situação é semelhante em praticamente todo o estado. Ao longo do final de semana, entretanto, algumas pancadas de chuva localizadas e isoladas podem atingir o Sul de Minas e a Zona da Mata, em virtude da frente fria que avança pelo oceano. Hoje, a máxima prevista é de 43°C para o estado.
Em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, a temperatura pode chegar aos 40°C neste sábado. Ontem, essa região computou no município de Campina Verde a maior temperatura de todo o estado, conforme o Inmet. Os termômetros chegaram a marcar 40,3°C na cidade de 20 mil habitantes, distante menos de 50 quilômetros da divisa com Goiás.
Situação semelhante em outras cidades-polo, onde a máxima será de 37°C: é o caso de Montes Claros (Norte) e Poços de Caldas (Sul). Já em Teófilo Otoni (Vale do Jequitinhonha) os termômetros vão marcar até 35°C. Essas outras grandes cidades mineiras também sofrerão queda de temperatura no domingo. Contudo, a situação volta a ser de muito calor na segunda e, sobretudo, na terça-feira. As informações são do Instituto de Meteorologia de Minas Gerais (Inmet).© Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press Josi e Rafael tentam se refrescar com sorvete em Belo Horizonte: capital registrou temperatura de 36,1 graus e previsão é de alta
SAÚDE
De acordo com a classificação da OMS, índices de umidade relativa do ar abaixo de 20% são considerados estado de alerta em saúde. Entre 20% e 30%, estado de atenção. Os percentuais considerados ideais estão entre 50% e 80%. Quando o tempo está muito seco, as vias respiratórias fazem um esforço maior. Com isso, as defesas do corpo diminuem. Assim surgem as viroses, alergias, inflamações por bactérias, rinites, sinusite (nos seios da face), asma. Ar seco adicionado ao calor pode levar também a quadros de desidratação.
Diante da secura e do calorão que abafa Minas Gerais, a Defesa Civil de Belo Horizonte alerta para os cuidados com a saúde. O órgão indica hidratação frequente, entre outros cuidados (veja quadro). Com os incêndios em alta, vale também o alerta para evitar queimadas a todo custo. Caso o cidadão se depare com alguma ocorrência do tipo, deve acionar o Corpo de Bombeiros (193), a Defesa Civil (199) ou a Polícia Militar (190).
CUIDE-SE
» Hidrate-se durante o dia» Prefira alimentos leves e frescos, como saladas, frutas, carnes grelhadas» Evite frituras» Durma em local arejado e umedecido por aparelhos umidificadores, ou ainda coloque uma bacia com água» Evite atividades físicas ao ar livre e exposição ao sol entre as 10h e as 17h;» Evite banhos com água quente, para não potencializar o ressecamento da pele. Se necessário, use hidratante» Em caso de problemas respiratórios procure um especialista» Se for se expor ao sol, use protetores, chapéus ou bonés e óculos escuros» Em caso de incêndio em mata ou floresta, avise imediatamente ao Corpo de Bombeiros (193), Defesa Civil (199) ou Polícia Militar (190)
*Estagiário sob supervisão da subeditora Rachel Botelho© Edésio Ferreira/EM/D.A Press
© Edésio Ferreira/EM/D.A Press Incêndio de grandes proporções ameaçou casas e exigiu empenho de bombeiros e moradores no combate às chamas no Bairro Santa Cruz
Ataque à natureza e aos pulmões
“A Serra do Cipó grita por socorro.” A frase estampada em um cartaz com pedido de ajuda a brigadistas que combatem incêndio na região desde domingo põe em evidência a grave situação por que passa um dos principais cartões-postais de Minas Gerais. Chamas como as que consomem as matas do parque, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, ainda sem controle, são vistas estado afora. A natureza agoniza e o perigo chega cada vez mais perto da população. O fogo se aproxima das casas e do comércio. Não apenas as equipes do Corpo de Bombeiros e brigadistas, mas os próprios moradores tentam controlar o fogo, numa cena que se repete até mesmo em áreas urbanas, como ocorreu na manhã de ontem no bairro Santa Cruz, Região Nordeste da capital. Mas baldes, bacias e mangueiras estão longe de ser ferramentas adequadas. Além do desgaste físico de quem está na linha de frente no enfrentamento aos incêndios – as equipes têm que lidar com situações extremas, como temperaturas que chegam a ultrapassar 75°C –, a fumaça e a fuligem que tomam conta dos arredores são prejudiciais à saúde da população.
Os efeitos nocivos das queimadas são análogos ao que acontece no caso da poluição atmosférica originada de veículos, quando há combustão de material orgânico, que acaba ficando suspenso no ar em forma particulada. Estudos que comprovam essa relação foram feitos, por exemplo, observando a queima de cana-de-açúcar em propriedades no interior de São Paulo. É o que explica o médico Elie Fiss, pneumologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. O produto das queimadas são inúmeras substâncias, muitas tóxicas. “Quando há um nível elevado de contato com a fumaça, ou aumento da poluição, naturalmente cresce em 20%, em pouco tempo, a procura em prontos-socorros por pessoas com sintomas respiratórios”, diz o médico.
Para quem já apresenta comorbidades, a exposição à fumaça agrava problemas como asma, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), enfisema, bronquite crônica, fibrose pulmonar, além de problemas cardíacos, como arritmia e infarto do miocárdio, e neurológicos, como o acidente vascular cerebral (AVC). “Pessoas que já têm esses problemas podem rapidamente entrar em crise. Quem não tem, pode desenvolver”, alerta.
A pneumonia por hipersensibilidade, por exemplo, é um tipo de pneumonia diferente da de origem bacteriana, que acontece quando os pulmões são inflamados pela inalação de substâncias estranhas, como poeira, fungo e fumaça, entre outros. “O tempo para que as doenças se manifestem, quando há a exposição, depende de cada organismo. A forma de evitar transtornos é sair de perto da fumaça. Não tem outro jeito”, orienta o especialista.
Edna Aparecida Pereira, de 43 anos, podóloga, mora há seis no vilarejo Lapinha do João Congo, parte do município de Jaboticatubas. Ela conta que, em um primeiro momento, o marido, Júlio César, percebeu um foco de incêndio na manhã de segunda-feira, em uma área a cerca de seis quilômetros de onde vivem, em uma região de difícil acesso. Por três dias, Júlio César e um amigo se embrenharam na mata para tentar conter o fogo usando baldes e canecos, sem nenhum equipamento de segurança. Ainda sem o apoio do Corpo de Bombeiros, eles percorreram quase 10 quilômetros para enfrentar as chamas, que chegavam cada vez mais perto da vizinhança.
A fumaça e as cinzas no ar têm sido um grande incômodo. “Está insuportável para respirar. O calor é muito grande. Tive queda de pressão e há pessoas que estão sangrando pelo nariz. De tão quente, nem nossos cavalos estão conseguindo se alimentar”, lamenta Edna. A podóloga lembra que a situação é ainda pior para os idosos, que são maioria no vilarejo. “Não temos que combater o fogo, temos que prevenir. Todo ano isso acontece. Pedimos atitude das autoridades”, cobra. Ontem, o combate contava com o apoio de duas aeronaves AirTractor, que despejavam água sobre as chamas. E 117 pessoas estavam envolvidas no combate ao fogo. Os trabalhos prosseguem hoje.
BAIRRO SANTA CRUZ
Ainda na manhã de ontem, um incêndio de grandes proporções mobilizou moradores do bairro Santa Cruz, Região Nordeste de Belo Horizonte. O fogo atingiu uma área de vegetação e chegou muito perto de casas e outros imóveis. O fogo começou por volta das 8h em um terreno na Rua Luiz Peçanha, perto do Anel Rodoviário, e se espalhou rapidamente. Moradores correram para salvar carros das garagens próximas à vegetação e tentar apagar as chamas com a água de mangueiras dos quintais e baldes. Eles suspeitam de incêndio criminoso.
Aos 77 anos, 73 deles morando no bairro, João Torres contou que os incêndios na área são comuns, mas ontem a proporção foi maior. Os moradores se assustaram. “O pessoal apela, mas fazer o quê? Com essas mangueirinhas não tem jeito. Quando os bombeiros chegaram começou a melhorar”, comentou.
O chefe do Estado-Maior do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, coronel Erlon Botelho, esteve no local do incêndio e deu mais detalhes sobre o combate. “Trata-se de um declive, uma grande extensão de lote vago com muito material combustível e lixo. Em volta, temos casas na parte de baixo e alguns estabelecimentos utilizados para armazenamento que foram atingidos aqui próximo à rua”, explicou.
Fonte: MSN